quinta-feira, 22 de fevereiro de 2024

Veneno de aranha brasileira vira esperança de tratamento contra câncer


"Ao estudar aranhas do gênero Vitalius, encontramos no veneno uma atividade neuromuscular. Fomos atrás da toxina responsável por esse efeito, que era uma poliamina grande e instável", lembra o bioquímico Thomaz Rocha e Silva.


Veneno de aranha brasileira vira esperança de tratamento contra câncer


O câncer é uma das doenças mais temidas e desafiadoras da atualidade, afetando milhões de pessoas no mundo todo. Apesar dos avanços da medicina, muitos tipos de câncer ainda não têm cura ou tratamento eficaz. Por isso, a busca por novas alternativas terapêuticas é constante e envolve diversas áreas do conhecimento. Uma delas é a biotecnologia, que utiliza recursos naturais para desenvolver produtos e processos inovadores. Nesse contexto, o veneno de aranhas brasileiras tem se mostrado uma fonte promissora de substâncias com potencial anticancerígeno.


O que são aranhas do gênero Vitalius?



As aranhas do gênero Vitalius são aracnídeos encontrados principalmente na região sudeste do Brasil, especialmente nos estados de São Paulo e Minas Gerais. Elas pertencem à família Theraphosidae, que engloba as chamadas aranhas-caranguejeiras ou tarântulas. Essas aranhas são grandes, peludas e possuem quelíceras (apêndices bucais) com glândulas de veneno. Elas se alimentam de insetos, pequenos vertebrados e até de outras aranhas. Algumas espécies são consideradas ameaçadas de extinção devido à perda de habitat e ao comércio ilegal.

As aranhas do gênero Vitalius são de interesse científico por causa da diversidade e complexidade de seus venenos. Esses venenos são compostos por centenas de moléculas, chamadas de toxinas, que têm diferentes efeitos sobre o organismo. Algumas dessas toxinas podem interferir na comunicação entre as células nervosas e musculares, causando paralisia, dor e inflamação. Outras podem afetar o sistema imunológico, o sistema cardiovascular e o sistema endócrino. Essas propriedades podem ser exploradas para o desenvolvimento de novos fármacos, como analgésicos, anti-inflamatórios, anticoagulantes e, claro, anticancerígenos.


Como o veneno de aranha pode combater o câncer?


O câncer é caracterizado pelo crescimento descontrolado de células anormais, que podem invadir e destruir os tecidos e órgãos do corpo. Esse processo é regulado por uma série de sinais químicos que estimulam ou inibem a divisão celular. Quando esses sinais são alterados, as células perdem o controle e se multiplicam sem parar, formando tumores. Além disso, as células cancerígenas podem se desprender dos tumores e se espalhar pelo organismo, dando origem às metástases.

O veneno de aranha pode combater o câncer de duas formas principais: induzindo a morte das células tumorais ou impedindo a sua proliferação. Isso pode ser feito por meio de toxinas que atuam em alvos específicos, como receptores, canais, enzimas ou proteínas, que estão envolvidos na regulação do ciclo celular. Por exemplo, algumas toxinas podem bloquear a entrada de cálcio nas células, o que é essencial para a sua sobrevivência e divisão. Outras podem inibir a atividade de enzimas que participam da síntese de DNA, o que impede a replicação do material genético. Ainda outras podem ativar vias de apoptose, que é o processo de morte celular programada.


Quais são as vantagens do veneno de aranha como fonte de anticancerígenos?




Uma das principais vantagens do veneno de aranha como fonte de anticancerígenos é a sua especificidade. Isso significa que as toxinas podem reconhecer e se ligar apenas às células tumorais, poupando as células normais. Isso reduz os efeitos colaterais e aumenta a eficácia do tratamento. Além disso, o veneno de aranha é uma fonte natural e renovável de moléculas, que podem ser isoladas, purificadas e modificadas para melhorar as suas propriedades farmacológicas. O veneno de aranha também apresenta uma grande diversidade de toxinas, que podem atuar em diferentes tipos de câncer e em diferentes estágios da doença.


Quais são os desafios do veneno de aranha como fonte de anticancerígenos?


Apesar das vantagens, o veneno de aranha também enfrenta alguns desafios para se tornar uma fonte de anticancerígenos. Um deles é a dificuldade de obter uma quantidade suficiente de veneno para os estudos e testes. As aranhas produzem pequenas quantidades de veneno, que devem ser extraídas manualmente, o que é um processo trabalhoso e arriscado. Outro desafio é a complexidade e a instabilidade das toxinas, que podem se degradar ou perder a sua atividade ao longo do tempo. Além disso, as toxinas podem apresentar toxicidade sistêmica, ou seja, causar danos a outros órgãos e sistemas do corpo, além do alvo desejado. Por isso, é necessário realizar uma série de ensaios pré-clínicos e clínicos para avaliar a segurança e a eficácia das toxinas antes de serem usadas em humanos.


Conclusão


O veneno de aranha brasileira é uma fonte promissora de substâncias com potencial anticancerígeno, que podem induzir a morte ou inibir a proliferação das células tumorais. Essas substâncias são específicas, naturais e diversificadas, o que representa uma vantagem em relação aos tratamentos convencionais. No entanto, o veneno de aranha também apresenta alguns desafios, como a obtenção, a estabilidade e a toxicidade das toxinas, que devem ser superados para que elas possam ser utilizadas como fármacos. Por isso, é necessário investir em mais pesquisas e desenvolvimento nessa área, que pode trazer benefícios para a saúde e para a biodiversidade.






Referências


Rocha-e-Silva, T. A., Sutti, R., Antoniazzi, M. M., & Jared, C. (2014). Venoms of theraphosid spiders: a review. Toxicon, 83, 163-178.

Oliveira, J. S., Mendes, T. M., Oliveira, M. F., & Pimenta, A. M. (2018). Spider venoms: a rich source of acylpolyamines and peptides as potential leads for CNS drug development. Frontiers in pharmacology, 9, 1-19.

Santos, R. G., Batista, C. V., Cordeiro, M. N., & Richardson, M. (2018). Spider venoms and their components as potential antitumor agents. Current medicinal chemistry, 25(40), 5612-5630.

Gomes, F. M., de Souza, B. M., Palma, M. S., & Arantes, E. C. (2019). Spider venom peptides as a rich source of bioactive compounds for drug discovery. Current topics in medicinal chemistry, 19(5), 338-358.

Silva, L. P., de Souza, B. M., & Arantes, E. C. (2020). Spider venom peptides as potential drug candidates for cancer therapy. Expert opinion on drug discovery, 15(6), 729-741.

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